INTRODUÇÃO
De acordo com o artigo 6º da Constituição Federal (CF/88), o trabalho é um direito social que poderá ser exercido pelas pessoas livres, assim como pelas pessoas que estão reclusas, pois se trata de uma norma de abrangência genérica. No que tange às pessoas reclusas, o artigo 28 da Lei de Execução Penal (LEP – Lei nº 7.210/84) regulamenta e
determina que o trabalho tem como finalidade a educação e a ressocialização do condenado, o qual pode, dessa maneira, produzir e se profissionalizar, a fim de voltar à sociedade e exercer os seus direitos e obrigações como um cidadão comum. Nesse sentido, o artigo 41, incisos II e VII da Lei nº 7.210/84 define o trabalho do preso como um direito, em que
há a atribuição do trabalho, bem como a possibilidade de o preso exercer as suas atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas, desde que elas não sejam incompatíveis com a execução da pena.
PRESOS EM REGIME ABERTO, REGIME SEMIABERTO E REGIME FECHADO
De acordo com o artigo 33 do Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848/40), a pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto, e a de detenção, em regime semiaberto ou aberto, com a possibilidade de progressão da pena, ou seja, se forem preenchidos os requisitos legais, o condenado poderá passar de um regime mais rígido para um mais brando, além de que, a depender do caso, o condenado poderá passar de um regime mais brando para um mais severo, nos termos do artigo 33, § 1º do Decreto-Lei nº 2.848/40. Dessa forma, a pena de reclusão é destinada às condenações mais severas, cujo cumprimento poderá ser em regime fechado, semiaberto ou aberto, em estabelecimentos de média ou máxima segurança. Já a pena de detenção é aquela aplicada às condenações mais leves, em que o cumprimento inicial não é no regime fechado. Geralmente, a detenção é cumprida inicialmente no regime semiaberto em colônias agrícolas, industriais ou similares ou, quando for no regime aberto, em casas de albergado e estabelecimento específico.
FINALIDADE
Nos termos do artigo 28 da Lei nº 7.210/84, o trabalho do preso tem como função o dever social garantido pelo artigo 6° da CF/88, bem como a garantia da dignidade humana, princípio assegurado pelo artigo 1°, inciso III da CF/88, alcançando, por fim, a finalidade educativa e produtiva.
INAPLICABILIDADE DA CLT – LEI Nº7.210/84
O trabalho do preso não se sujeita às regras estabelecidas na CLT, pelo que se estabelece no artigo 28, §2º da Lei nº 7.210/84, pois, nessa situação, não há uma prestação de serviços espontânea, mas sim uma obrigação imposta ao preso, determinada pelo artigo 31 da Lei nº 7.210/84. Acartilha “Manual: mão de obra prisional”, elaborada pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen), estabelece que, se a empresa quiser realizar a contratação do trabalho do preso com base na Lei nº 7.210/84, será obrigatória a realização de convênio com a fundação que faz a intermediação da mão de obra ou ainda com o sistema prisional. Ademais, essa cartilha estabelece que, caso a contratação da mão de obra não seja realizada mediante a Lei nº 7.210/84, o registro será regido pela CLT, de maneira que o empregado fará jus a todos os direitos estabelecidos na legislação trabalhista e previdenciária.
PRESTAÇÃO DE SERVIÇO À COMUNIDADE
A prestação de serviço à comunidade é uma pena restritiva de direito, alternativa à pena de prisão, ou seja, os serviços prestados à comunidade substituem a pena de
prisão. Desse modo, como se trata de cumprimento de pena, não há que se falar em remuneração pelos serviços prestados, o que se infere pelo artigo 30 da Lei nº 7.210/84.
De acordo com o artigo 46, § 2º do Decreto-Lei nº 2.848/40, os serviços prestados pelo condenado de forma gratuita devem se destinar a fins comunitários ou entidades
estatais. Desse modo, os serviços não podem ser prestados às entidades com fins lucrativos.
CONVÊNIOS
Ressalta-se que a iniciativa privada que tiver interesse na contratação do trabalho do preso, com base na Lei nº 7.210/84, poderá firmar convênio com a fundação que
intermedeia mão de obra ou com o próprio sistema prisional, de acordo com o artigo 34, § 2º da Lei nº 7.210/84. Nesse sentido, a Portaria Interministerial MSP/MDH
n° 003/2018 estabelece os procedimentos para a contratação de mão de obra formada por pessoas presas ou egressas do sistema prisional, a qual determina a política nacional de
trabalho no âmbito do sistema prisional.
TRABALHO EXTERNO
De acordo com o artigo 36 da Lei nº 7.210/84, os presos em regime fechado são habilitados para o trabalho externo, ou seja, fora da penitenciária, apenas em serviços ou obras públicas ou instituições privadas, desde que isso seja autorizado pela direção do presídio. Além disso, ainda devem ser adotadas medidas que evitem a fuga e sejam a favor da
disciplina. Ademais, no serviço ou na obra, o total de número de presos não pode ultrapassar 10% do total de empregados no serviço ou obra, conforme o artigo 36, § 1º da Lei nº 7.210/84, e, nos termos do artigo 36, § 3º da Lei nº 7.210/84, o trabalho externo em entidade privada depende da anuência do preso. Com base no artigo 37 da Lei nº 7.210/84, para o preso realizar o trabalho externo, é necessário observar os seguintes requisitos:
– autorização pela direção do estabelecimento;
– aptidão, disciplina e responsabilidade do preso; e
– cumprimento de 1/6 da pena.
Além disso, o artigo 37, parágrafo único da Lei nº 7.210/84 estabelece que será revogada a autorização do trabalho externo, se o preso praticar crime, for punido por falta grave ou tiver comportamento contrário ao estabelecido no artigo 37 da Lei nº 7.210/84. É importante destacar, ainda, que o trabalho externo do preso não configura vínculo empregatício. Desse modo, é inaplicável a CLT, conforme o artigo 28, § 2º da Lei nº 7.210/84.
PRESO EM REGIME SEMIABERTO OU REGIME ABERTO
De acordo com o artigo 35, § 1º do Decreto-Lei nº 2.848/40, o condenado que está no regime semiaberto poderá trabalhar em trabalho comum no período diurno em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar. Já no que se refere ao condenado que está em regime aberto, o artigo 36, § 1º da Lei nº 7.210/84 determina que deverá, fora do estabelecimento prisional e sem vigilância, trabalhar, frequentar curso ou exercer outra atividade autorizada, permanecendo recolhido durante o período noturno e nos dias de folga.
POLÍTICA NACIONAL DE TRABALHO NO SISTEMA PRISIONAL
A Política Nacional de Trabalho no âmbito do Sistema Prisional (Pnat) tem previsão no Decreto nº 9.450/2018 e tem como finalidade a inserção dos presos provisórios, das pessoas privadas de liberdade em cumprimento de pena no regime fechado, semiaberto e aberto e das pessoas egressas do sistema prisional no mercado de trabalho, a fim de que possam ter renda própria.
REMUNERAÇÃO
A remuneração recebida pelo preso é ajustada mediante tabela previamente elaborada com os respectivos valores, levando-se em consideração que o valor mínimo não poderá ser menos de 3/4 do salário mínimo nacional, de acordo com o artigo 29 da Lei nº 7.210/84, cuja forma de pagamento será conforme o estabelecido no convênio. A respectiva remuneração do preso tem como finalidade atender a alguns pressupostos mínimos trazidos pelo artigo 29, § 1° da Lei nº 7.210/84, visando:
a)à indenização dos danos causados pelo crime, desde que determinados judicialmente e não reparados por outros meios;
b)à assistência à família;
c)a pequenas despesas pessoais;
d)ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado, em proporção a ser fixada e sem prejuízo da destinação prevista nas letras anteriores.
Por fim, como determina o artigo 29, § 2° da Lei nº7.210/84, excluídas outras determinações legais, ainda haverá depósito do valor remanescente para constituição do pecúlio em caderneta de poupança, que será entregue ao condenado assim que ele for posto em liberdade.
JORNADA DE TRABALHO
De acordo com artigo 33 da Lei nº 7.210/84, a duração do trabalho não deve ser inferior a seis horas e superior a oito horas diárias, com direito ao descanso nos domingos e feriados, com exceção do trabalho de conservação e manutenção do estabelecimento penal, para o qual poderá ser designada jornada especial de trabalho.
A legislação não menciona procedimentos a serem adotados quanto à realização de horas extras pelo trabalhador preso (como a possibilidade de compensação de jornada, a remuneração etc.). Pressupõe-se, assim, que tais questões sejam dirimidas no próprio contrato do convênio.
ASPECTOS PREVIDENCIÁRIOS DO TRABALHO DO PRESO
Com relação ao aspecto previdenciário do trabalho do preso, o artigo 41, inciso III da Lei nº 7.210/84 estabelece que a Previdência Social é um direito do preso. Da mesma forma, o artigo 39 do Decreto-Lei nº 2.848/40 estabelece que o trabalho do preso sempre será remunerado e que lhe serão garantidos os benefícios previdenciários. Embora o trabalho do preso não seja regido pela CLT, nos termos do artigo 23, inciso VI da Lei nº 7.210/84, é de responsabilidade do serviço de assistência social providenciar documentos relativos ao benefício previdenciário do preso, bem como os relativos ao acidente de trabalho. Nesse sentido, de acordo com o artigo 15 da Lei nº 8.213/91, o preso mantém a qualidade de segurado até 12 meses após a obtenção da liberdade, independentemente de contribuições. Por fim, o artigo 11, inciso IX do Decreto nº 3.048/99 estabelece que o preso que não tiver vinculação em quaisquer regimes da Previdência Social nem exercer atividade com remuneração poderá se filiar à Previdência Social como segurado facultativo. O pagamento da Guia da Previdência Social (GPS) com código específico para contribuinte facultativo é 1406 para recolhimento mensal ou 1457 para recolhimento trimestral, que poderá ser emitida por meio do Sistema de Acréscimos Legais (SAL).
DIFERENÇAS ENTRE TRABALHADOR PRESO E EMPREGADO PRESO
É importante deixar claro que as figuras do preso trabalhador e do empregado preso não se confundem. O preso trabalhador é aquele que foi condenado e busca por meio do seu trabalho a remição da sua pena. Geralmente, esse tipo de trabalho se dá mediante convênio cujas regras não são fundamentadas na CLT. Por outro lado, o empregado preso é aquele que, no curso do contrato de trabalho regido pela CLT, é preso, deixando de prestar serviços para o empregador. Nessa situação, há entendimentos de que o contrato ficaria
suspenso, ou ainda, que poderiam ser aplicadas faltas até que ocorra a rescisão contratual.